Arraial do Orgulho do Porto cancelado por “falta de apoio financeiro” da câmara, queixa-se organização

A organização da Marcha do Orgulho do Porto tomou a decisão de cancelar o arraial que tradicionalmente procede à manifestação. Ao JPN, a organização esclarece que o evento não se vai realizar por falta de verba, lamentando a recusa de apoio financeiro por parte da Câmara do Porto. Autarquia lamenta decisão e garante que apoio concedido está em linha com o dos anos anteriores.

A vigésima edição da Marcha do Orgulho no Porto não será seguida pelo “Arraial + Orgulhoso” Foto: Leonor Gonçalves

“Arraial + Orgulhoso”, que estava previsto ser realizado a 28 de junho, após a Marcha do Orgulho do Porto (MOP), foi cancelado por falta de recursos. Filipe Gaspar, representante da comissão organizadora da Marcha do Orgulho do Porto (COMOP), declara ao JPN que foi feito um pedido de apoio financeiro à Câmara Municipal do Porto, mas que este foi recusado. Para a comissão organizadora do evento, “é impensável estar a levantar um arraial, com uma taxa de esforço comunitária muito grande, do zero, sem qualquer tipo de apoio institucional”. A autarquia “lamenta a decisão da organização” de cancelar o arraial.

A organização solicitou apoio financeiro para cobrir os custos de policiamento, aluguer de bancas para coletivos, aluguer de equipamentos de som, remuneração para artistas e seguro de responsabilidade civil. Este pedido de financiamento foi recusado pela Câmara do Porto, que justifica a decisão com “o princípio de equidade no apoio disponibilizado a outros eventos e iniciativas civis que se realizam na cidade do Porto, e que procuram, junto do Município, obter apoio para a sua concretização”, num esclarecimento enviado ao JPN.

Em alternativa, a Câmara do Porto mostrou “disponibilidade para apoiar o evento, nos mesmos moldes seguidos em anos anteriores”, esclarece o gabinete de Rui Moreira. O representante da COMOP confirma: “A Câmara não se negou a apoiar na logística. O palco é [da festa da noite] do São João e eles permitem-nos a utilização, assim como também ajudam com as licenças de ruído e de venda de bebidas. Mas um arraial não se faz só de um palco. Precisávamos de alugar equipamento de som e fazer um pagamento simbólico aos artistas, que têm atuado sempre gratuitamente quando vêm até ao nosso arraial, e achamos que não é bom não receberem absolutamente nada.”

A organização  do evento mostra-se descontente. “Ficámos com alguma indignação. Saber que tantos eventos, tantas associações e até empresas recebem apoios de milhões e de milhares [de euros], e nós pedimos uma quantia tão simbólica… Ter este tipo de resposta da Câmara faz-nos questionar realmente a sua legitimidade em relação a estas questões”, afirma Filipe Gaspar, ao JPN. “Estamos a falar, no máximo, de 10 mil euros. É um valor que é uma migalha. A Câmara gasta isso, se for preciso, só em tapetes e carpetes vermelhas para um evento qualquer. [A Câmara] tem dado tantos apoios culturais, nomeadamente ao Primavera Sound. Os números são públicos. Só este ano, foram orçamentados quase 3 milhões em apoios para eventos na cidade do Porto”, comenta o representante.

Filipe Gaspar recrimina a Câmara quanto ao seu apoio ao movimento: “O pedido vem no seguimento de um hastear da bandeira LGBT [por parte da autarquia, no Dia Internacional contra a Homofobia, a Transfobia e a Bifobia]. Achámos que, com o hastear da bandeira, a Câmara estava a abrir oficialmente um compromisso com o movimento, que está na cidade há 20 anos a lutar e a fazer trabalho comunitário. É uma desilusão perceber que é uma fachada. O que é que adianta andar a pôr uma bandeira se depois, na prática, não estão a ajudar as associações e os coletivos a mostrarem-se e a saírem da invisibilidade?”

Apesar de a marcha em si não requerer apoio financeiro, Filipe Gaspar confessa a sua tristeza pela falta de “apoio em presença” por parte da autarquia: “Nunca vi o executivo da Câmara do Porto na Marcha. Isso também é uma forma de apoiar.”

“Levantar esta marcha e este arraial nunca é uma coisa muito orgânica, há sempre algum tipo de entrave quanto ao arraial”, afirma Filipe Gaspar, recordando que em 2023 não foram autorizados a realizar o evento no Largo Amor de Perdição e este foi alterado para a zona do Covelo. Relativamente à edição do ano passado, o membro da organização explica que o “grande entrave foi o [custo do] policiamento. Tínhamos tudo preparado e, de repente, no dia anterior à marcha, recebemos a notícia de que íamos ter de pagar cinco mil euros. Ficamos em desespero, porque não tínhamos esse valor, nem estávamos a contar com ele.” O representante alega que o valor aumentou de quinhentos para cinco mil euros entre 2023 e 2024, tendo o custo sido dividido com a Câmara na última edição do evento, que também disponibilizou elementos da Polícia Municipal de forma a conseguir reduzir o número de ativos e diminuir a despesa.

A questão do custo de policiamento é uma “luta” para a COMOP, como explica Filipe Gaspar: “A polícia só nos pede dinheiro quando não é uma manifestação. Mas, no nosso entender, o arraial é uma extensão da marcha, continua a ser um momento político. Os artistas que vêm são artistas de intervenção, que trazem a mensagem pró-humanitária. Mas, a partir do momento em que nós temos o palco e as barraquinhas com as associações, eles consideram um evento”.

Esta será a vigésima edição da Marcha do Orgulho LGBTI+ do Porto. A manifestação realiza-se no dia 28 de junho, às 15h00, na Avenida dos Aliados. O lema desta edição é “Direito a existir, dever de resistir”, de forma a clarificar que “num tempo de ameaças e apagamentos, a visibilidade continua a ser uma urgência política”, afirma a organização. A escolha do lema deste ano faz referência ao guia “Direito a Ser”, um recurso educativo criado pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) e a Direção-Geral da Educação, com orientações para uma escola mais inclusiva, que foi retirado de circulação no início de 2025, pelo governo. “Este apagamento deliberado de temas como igualdade, género e orientação sexual compromete o direito de crianças e jovens a uma educação segura, inclusiva e baseada nos direitos humanos. Apagar a diversidade é perpetuar a violência”, refere a COMOP em comunicado.

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